quinta-feira, 26 de março de 2009

O Limite da Liberdade - Parte I



Seis meses após o governo do estado ter decretado situação de emergência no sistema prisional gaúcho, a equipe do Jornal Sobral com autorização do Delegado Regional da Susepe, (Superintendência de Serviços Penitenciários) Luiz Fernando Rodrigues, entrou no Presídio de Encruzilhada do Sul, onde quase 35% dos presos são butiaenses ou foram capturados na cidade.

Em série de reportagens a equipe do Jornal Sobral foramda por Aline Kaczynski, Joel Maraschin e Sérgio Fernandes mostra a você leitor como é a vida dentro da Penitenciária Estadual de Encruzilhada do Sul. Distante 93 km de Butiá, o presídio atende também Amaral Ferrador, Dom Feliciano, Minas do Leão, Santa Cruz do Sul e Porto Alegre.

Do total de 44 vagas, até quarta-feira, dia 25, havia 97 detentos, mais que o dobro de sua capacidade. Destes 97, exatos 32 são naturais de Butiá ou foram apreendidos aqui, 11 já condenados e 21 com prisão provisória. E o mais alarmante, a média de idade dos detentos é de 20 anos.

Estes índices de criminalidade em Butiá são preocupantes, nenhuma outra cidade possui tantos apenados em Encruzilhada como aqui. Sem contar os dados extra-oficiais, que há mais de 100 butiaenses presos no Sistema Penitenciário de Charqueadas.

Os delitos são diversos, mas na sua maioria estão ligados ao consumo de drogas, em especial o Crack (80%), que leva ao uso, o tráfico, o furto, o roubo e até ao latrocínio.

O assunto é tão sério que a CNBB no tema da Campanha da Fraternidade dá destaque aos presídios. Segundo criminalistas, o reflexo da super lotação das penitenciárias é o aumento da criminalidade nas cidades. E é exatamente isso que está acontecendo em Butiá.


Conhecendo a Penitenciária



Com mais de 40 anos de história e 19 instalada em um prédio novo, o presídio de Encruzilhada segue ao contrário do que acontece na maioria dos presídios da região metropolitana, que em vez de punir e recuperar viraram território de propagação do crime. Lá não é assim, e se diferencia dos demais no estado pela maneira como os presos são tratados.

Tendo três agentes penitenciários por turno, que fazem a segurança diária e uma revista rigorosa, dificilmente passam drogas e celulares, mas já foram encontrados em revistas gerais. Armas, somente as de confecção artesanais, feitas pelos próprios presos. Nunca houve rebeliões, apenas algumas insatisfações e reclamações que logo foram negociadas. O índice de fuga é extremamente baixo.

Cada cela possui em média seis presos, quatro com camas e dois em colchões, banheiros com chuveiro quente, rádio e TV. São quatro refeições diárias, com direito a sobremesa e as mais diversas carnes. O banho de sol dura normalmente duas horas. Quanto à fé, cultos religiosos evangélicos e católicos acontecem com freqüência. Sem esquecer é claro do acompanhamento psicológico.


Um meio de ressocialização

Possuindo todos os tipos de regimes, fechado, semi-aberto e aberto, a penitenciária proporciona a todos que tentem achar uma maneira de se reintegrarem à sociedade. Por isso, diversas atividades são realizadas, como aulas de 1ª a 4ª série para quem parou de estudar ou não teve a oportunidade de freqüentar uma sala de aula.

Quem se interessa pelas artes pode trabalhar com artesanato dentro da cela, e ainda há aqueles que fazem a manutenção do presídio limpando os corredores, o pátio, fazendo a comida, cuidando da horta. Também há os que trabalham pela comunidade, pintando escolas e auxiliando em sua manutenção. Já os que cumprem a pena no regime semiaberto, durante o dia são encaminhados para o serviço externo como o plantio de mato (silvicultura), em serrarias, agricultura e nas mais diversas áreas. À noite, por volta da 20h30 voltam para dormir na penitenciária.


“Muita Psicologia”

O Diretor do presídio Márcio Cleber Dutra, há 16 anos trabalhando na Susepe, e há dois como diretor da Penitenciária Estadual de Encruzilhada do Sul, relata que diariamente conversa com os apenados, pois é necessário este contato para evitar áreas de conflito no estabelecimento prisional. Garante ele, que é necessário usar de “muita psicologia” para entender os jovens na maioria entre 18 e 20 anos que estão privados da liberdade. “Vou de peito aberto conversar com eles, sem arma, sempre tentando entende-los”, afirmou Márcio.

Apesar do trabalho desenvolvido junto aos presos, buscando sua recuperação e reintegração na sociedade, é muito grande o número de ex-presidiários que voltam a reincidir. São pessoas envolvidas com drogas e também vítimas do alcoolismo. Ao cumprirem a pena, retornam as ruas e geralmente ao consumo de drogas.

Sofrimento da Família

O Diretor Márcio, que diariamente convive com o drama dos presos, também precisa atender familiares que as quartas-feiras e aos domingos visitam os presos. Muitas vezes pessoas pobres que não tem dinheiro para fazer uma refeição, são autorizados a almoçar no presídio. O Diretor além de administrar o convívio de 97 pessoas presas, duas tem atenção especial, pois são mulheres e precisam de uma rotina diferenciada dos demais.

Muitos familiares perdem com estas prisões, a única fonte de renda da família e necessitam também de acompanhamento psicológico. Márcio acompanha muitas vezes impotente, o drama de mães, esposas, filhos que se submetem a uma sofrida peregrinação até o presídio.



Na próxima edição, o complemento desta matéria e as histórias daqueles que cometeram um crime estão cumprindo pena, pagando uma dívida com a sociedade.

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