quinta-feira, 19 de março de 2009

A Nossa Raiz


“O vento minuano, partindo dos andes, toca as plagas riograndenses, e, revolvendo a poeira das gerações passadas retempera as gerações presentes”, com esta frase o Major João Cezimbra Jaques iniciava em 1912 o seu livro “Assuntos Rio-Grandenses”, o pioneiro na pesquisa sobre a cultura gaúcha.

O que ele não sabia é que quase cem anos depois, esta tão bem elaborada frase ainda faria sentido obvio para a cultura gaúcha. Mas mais importantes que isto, mais que preservamos nossas tradições às gerações futuras é mantermos elas vivas dentro de nosso ambiente passado.

O Centro de Tradições Gaúchas é, assim como o esporte, o teatro, as artes, o maior meio sócio, cívico, cultural de integração de crianças, jovens e adultos. É uma educação individual para a mente e para o corpo.

Do início dos anos 2000 quando nossa região chegou a ter mais 12 CTG’s em atividades com invernadas mirim, juvenis, adultas e xirús, envolvendo mais de mil pessoas, aos dias de hoje, esse número caiu abaixo da metade. Se somarmos cinco entidades tradicionalistas com atividades regulares, invernadas participando de competições e afins, estamos sendo otimistas. Já o número de envolvidos não deve chegar a trezentos.

Mas nesse período de renovação, foi possível notar uma nova consciência, não só de quem estava disposto a dançar, como também das famílias envolvidas. Um exemplo maior notei nesta segunda-feira, quando assisti o ensaio da invernada xirú do CTG Saudades do Pago. São pais e mães, que mesmo após um dia inteiro de trabalho, em plena uma segunda à noite estão lá firmes e fortes aprendendo as danças tradicionais do Estado.

Haveria mil motivos para ficarem em casa, o cansaço, mais trabalho, falta de tempo, qualquer coisa que os fizesse só levar e buscar os filhos dentro da entidade. Mas não! Participam junto deles em um momento de aprendizado e muita atenção. Até quem não tem filho participa, pois o interesse continua sendo igual.

Por isso preservar as tradições não é apenas tarefa das nossas crianças, é um movimento maior, que toma conta de pais e avós, que formam nossa célula mater. É mais que uma luta diária, é uma batalha incansável para manter vivo tudo aquilo que foi construído, pesquisado, e arquitetado dentro da nossa sociedade. Parabéns aos nove casais que vi ensaiando entusiasmados naquela noite e parabéns a patronagem da entidade pelo incansável apoio.

Cezimbra Jaques foi catedrático ao escrever também logo quando fundou o Grêmio Gaúcho de Porto Alegre em 1898 que “Um povo sem tradição, é um povo sem raiz”. Frases, atos e livros que lhe renderam o título de Patrono do Tradicionalismo, de maneira que ninguém até hoje se manteve inerte ao tempo com seu amplo conhecimento sobre a causa tradicionalista e os riscos que o futuro poderiam lhe oferecer.

Pais, mães, avós, filhos todos juntos devem se engajar nesta causa, para assim fazerem valer os anseios que o Major João Cezimbra Jaques tinha antes mesmo das nossas tradições chegarem ao ponto culminante que anda hoje em dia.

Um comentário:

Anônimo disse...

Aceito opiniões contrárias, mas sou partidário desta:

A música e as danças usadas como símbolo do Rio Grande do Sul não refletem o povo gaúcho. Na avaliação do músico popular Pedro Munhoz, essa cultura difundida nas festividades do 20 de Setembro e perpetuada nas gravadoras, nos festivais e nos programas nativistas da televisão apenas cria no imaginário da população uma cultura que nunca foi a sua.

Nem mesmo historicamente, analisa Munhoz, já que a tão festejada Revolução Farroupilha foi uma guerra dos latifundiários regionais contra o governo imperial. As danças, as músicas e os manuais criados nas décadas de 30 e 40 apenas reproduzem os costumes e fortalecem o domínio das classes gaúchas mais abastadas. A função do peão, destinada na história para o pobre branco e em algumas exceções para os negros, acabou sendo romantizada na cultura.

"A música, a cultura do Rio Grande expressa o latifúndio em toda a sua integralidade. Inclusive isso parte de músicos populares do estado, poetas, compositores, que muitos não têm ligação com o latifúndio mas que expressa esse interesse. A música do RS, eu diria que é uma das poucas que é tão arraigada a esse processo de poder. Tanto é que a Revolução Farroupilha é das poucas guerras no Brasil que não partiu do seio popular, não se criando nenhum vínculo com o povo. Cria-se através de quem criou todo esse processo ", argumenta.

O músico também critica o Movimento Nativista, criado na década de 70. Para Munhoz, o movimento apenas serviu para impor ainda mais essa cultura como sendo a do povo gaúcho. Ele defende a união dos artistas populares como alternativa ao estilo “Galpão Crioulo” dos programas de TV e dos festivais.

"Nas histórias dos festivais do RS tem muita coisa boa, muitos compositores bons, mas houve uma 'seleção natural' ou uma cooptação onde o que ficou é quem acena e quem concorda com o estabelecido. Então a música e a cultura gaúcha também estão ligadas a todo esse processo da indústria cultural em que se faz toda uma releitura das culturas regionais para que vire um produto de venda. Se existe o mercado urbano de música também existe o regional", diz.